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quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Schindler's List (1993)

E o passado aqui tão perto.


Da ficção - pelo que a própria etimologia indica- sempre se esperou uma imagem figurativa da realidade. Um processo que se revela bastante necessário se tivermos em conta a indigência do homem hipercomplexo, complemento de realidade e imaginação. É pois a desconstrução desta imagem o que nos impele, consequentemente, ao confronto entre realidade e ficção: o ponto em que uma e outra se confundem. E quase que é uma obrigatoriedade do cinema mostrar a versão da realidade que não é a que todos conhecemos -no entanto a excepção assume-se inevitável quando nos confrontamos com a Lista de Schindler. Desde o início sentimos que toda a aura de tons brancos e negros nos transporta ao tempo da História, e que melhor forma haveria para mostrar a tristeza e o sadismo doentio do Holocausto.
Sentimos que toda essa aura se abate sobre nós, implacável como Homem algum deveria jamais ter testemunhado: ainda que de forma ficcionada remete-nos em cada cena para a indelével realidade, uma e outra vez. Confundido-se. Arrastando-nos cada vez mais para o fundo do vórtice de insanidade e desumanidade da campanha Nazi. Arrepiando-nos quando se fazem ouvir vozes estridentes de crianças alemãs, repetindo: "Goodbye Juden!".
Abrindo-nos as portas do mais profundo abismo da loucura.
O Homem como uma quimera, um monstro, um caos, sujeito de contradições, um prodígio, juiz de todas as coisas, verme imbecil, depositário da verdade, cloaca de incerteza e erro, glória e nojo do universo: é esse o Homem que, em qualquer condição, detém o poder de escolha sobre si próprio -nunca sobre o outro. E é a quebra dessa barreira que nos revolta -relembrar que afinal existiram mesmo todos aqueles que, sujeitos à vontade de outros, passaram pelo último degrau do inferno. Aqueles que no final surgem -rompendo o murro no nosso estômago- da mesma forma que rompem a linha entre a realidade e a ficção. E qual ode à vida surge amiúde Oskar Schindler. Figura enigmática que possibilita que cerca de um milhar de judeus escapasse a uma morte certa. Porque afinal o poder reside em ter todos os motivos para matar alguém e no entanto não o fazer. Isso é poder. Isso é vida.

De muito em muito tempo surge um filme assim, daqueles que ao invés de outros, não diminui o conceito de cinema: pelo contrário, expande-o, toca conceitos que pareciam impenetráveis. Ao final a duração parece-nos infimamente curta para mostrar uma das fases mais dantescas do Homem. Torna-se assim impossível caracterizar uma obra de arte destas dimensões, ou sequer, referir planos, representações e géneros: é por si só o género. Uma visão de um inferno na Terra pelo olhar de Steven Spielberg, para que a memória perdure e a História não se repita. Porque o passado está aqui tão perto.

5 comentários:

  1. Grande critica não haja duvida.
    Este foi um dos filmes que mais me marcou, apesar de a primeira vista achar que não me iria captar muito interesse devido aos tons de cor e duração, aacabou por se tornar nos dos filmes que mais gostei de ver.

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  2. Concordo quando dizes que é um passado "demasiado" perto...um filme que no secúlo 21 se torna muito identico ao "seu seculo"...o teu comentário é excelente....tudo a ver com uma pessoa com ideias puras e viradas para uma boa ala...(esq.) continua ca espero novas noticias...

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  3. Adorei este filme sem duvida alguma! Alias, foi um dos melhores, senao o melhor filme q eu alguma vez vi. A tua critica está muito bem fundamentada. Muito bem zezinho :D

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  4. Como uma "ignorante" cinematográfica, mais uma vez não vi este filme ricamente cultural!Mas certamente depois de uma critica tão profunda, irei vê-lo.
    És bom nisto caramba!
    Parabéns!

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  5. Muito bom o filme.

    Certamente um clássico a ser relembrado por famílias para todo o sempre. Para alem de tão descritivo e dramático, este filme é ao que se pode chamar de uma pura sátira... E evidente por vezes o sarcasmo presente no filme.

    Perturbador, ele faz um enorme apelo à consciência de cada um, que este terror, por muito que se desejasse fictício, e um passado não muito distante...

    Este filme vai muito mais alem daquilo que se considera uma obra de arte. Considero o filme do grande Spielberg, uma obra de honra de uma vida.

    E parabéns pelo blog. E com criticas que se posiciona a nossa opinião. Continua o bom trabalho.

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